Monday, August 31, 2009

Identidade imortal

Esse rosto não era seu (ou era?).
Esses olhos grandes e escuros, sempre significativos, como se respondessem a perguntas jogadas ao vento por pessoas alheias.
Esses lábios cheios e sem cor, quase em bico, vivendo à espera de outros lábios para ganhar vida.
As olheiras marcadas, dando aquele ar de pessoa que realmente vive - ou ar de pessoa que espera a morte.

Esse rosto não é seu.
Não era por escolha sua que tinha esses olhos, esses lábios, essas olheiras.
E por que é que seu rosto tinha que definir quem ela era?
Por que, quando alguém lembrava dela, pensava em seu rosto? Desde quando seus olhos, seus lábios e suas olheiras definiam o seu jeito de ser?
E se não existissem espelhos? Melhor ainda, e se todos vivessem em um lugar sem a existência de rostos?
Cada um seria representado pela sua essência e pronto? E não limitados por olhos, lábios e olheiras...
Cada um seria a sua obra? Beethoven, a Nona Sinfonia; Shakespeare, Romeu e Julieta; Machado de Assis, Dom Casmurro; Debussy, Rêverie?
Como é que seria? Como pensariam nela? Como ela pensaria em si mesma?

Apenas palavras. Palavras soltas no ar (respondendo a perguntas alheias, esperando por respostas alheias também, vivendo a vida e a morte).

Esse rosto era seu (ou não era?).

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