Wednesday, July 23, 2008

E o trabalho infantil?

"On August 31, 2008 one million people will run the Nike+ 10K Human Race and raise funds for good causes. The UN Refugee Agency is proud to be one of the causes to benefit, through our ninemillion.org campaign.
Wherever you are - you can sign up to be part of the ninemillion team. Refugee children need your support and it doesn't take much - just your running shoes! You could even build a team!
Run for good. Run for refugee children!"

Nike?
A hipocrisia é, de fato, um dos principais ingredientes do capitalismo.

Monday, July 21, 2008

De uma infiel

Onde nasci, a morte é uma visita constante. Um vírus, uma bactéria, um parasita; a seca e a fome; soldados e torturadores matam qualquer um a qualquer hora. A morte chega nas gotas de chuva que se transforma em inundação. Apodera-se da imaginação dos que estão no poder e mandam os subordinados perseguirem, torturarem e matarem qualquer um que lhes pareça inimigo. A morte seduz muita gente a dar cabo à própria vida para fugir de uma realidade insuportável. Devido à idéia da honra perdida, muiras mulheres vêem a morte chegar pelas mãos do pai, do irmão ou do marido. Ela arrebata as jovens, no parto, e deixa o recém-nascido órfão nas mãos de estranhos.
Para quem vive na anarquia e na guerra civil, como na minha Somália natal, a morte espreita em toda parte.
(...)
Na infância, primeiro topei com a força bruta do islã na Arábia Saudita. Coisa muito diferente da religião diluída da minha avó, tão mesclada com práticas mágicas e crendices pré-islâmicas. A Arábia Saudita é a fonte e a quintessência do islamismo. O lugar em que se pratica a religião muçulmana na sua forma mais pura e a origem de grande parte da visão fundamentalista que, desde o meu nascimento, tem se propagado muito além de suas fronteiras. Naquele país, cada alento, cada passo que dávamos estava impregnado de conceitos de pureza ou pecado, e de medo. O pensamento volitivo acreca da tolerância pacífica do islã não pode afastar a realidade: decepam-se mãos, as mulheres continuam sendo apedrejadas e escravizadas, tal como decidiu o profeta Maomé há séculos.
O tipo de pensamento que presenciei na Arábia Saudita e na Fraternidade Muçulmana, no Quênia e na Somália, é incompatível com os direitos humanos e os valores liberais. Preserva uma mentalidade feudal arrimada em conceitos tribais de honra e vergonha. Apóia-se no auto-engano, na hipcrisia e em padrões dúplices. Depende dos avanços tecnológicos ocidentais ao mesmo tempo que finge ignorar sua origem no pensamento ocidental. Essa mentalidade torna a transição para a modernidade muito dolorosa para todos os praticantes do islamismo.
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Acusam-me de haver interiorizado o sentimento de inferioridade racial a ponto de atacar a minha própria cultura, movida pelo ódio a mim mesma, pois quero ser branca. É um argumento enfadonho. Acaso a liberdade existe unicamente para os brancos? Acaso é amor-próprio aderir às tradições dos meus ancentrais e mutilar as minhas filhas? Aceitar ser humilhada e impotente? Observar passivamente os meus conterrâneos espancarem as mulheres e se massacrarem em disputas sem sentido?
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As pessoas muitas vezes deduzem que sou revoltada por ter sido submetida à clitorectomia ou porque meu pai me casou com um desconhecido. Elas nunca deixam de acrescentar que essas coisas são raras no mundo muçulmano moderno. O fato é que centenas de milhões de mulheres, em todo o planeta, vivem em casamentos forçados e que seis mil meninas sofrem citorectomia diariamente. A mutilação não me afetou a capacidade intelctual; e quero ser julgada pela legitimidade dos meus argumentos, não como vítima.
A minha preocução central e motivadora é o fato de as mulheres serem oprimidas no Islã. Essa opressão impõe aos muçulmanos -homens e mulheres - um grande atraso em comparação com o Ocidente. Cria uma cutulra que provoca mais atraso a cada geração; Seria melhor para todos -sobretudo para os maometanos -que essa situação mudasse.
(...)
As pessoas se adaptam. Aquelas que nunca se sentaram em uma cedira aprendem a dirigir um carro e a operar uma máquina complexa; adquirem essa capacidade rapidamente. Do mesmo modo, os maometanos não precisam tardar seiscentos anos para modificar o seu modo de pensar a igualdade e os direitos individuais.
Quando procurei Theo para que me ajudasse a fazer "Submissão", eu queria transmitir três mensagens: primeiro, os homens e até as mulheres poder erguer os olhos e falar com Alá; os crentes têm a possibilidade de dialogar com Deus e de olhar para Ele de perto. Segundo, no islã de hoje, a interpretação rígida do Alcorão condena as mulheres a uma miséria intolerável. Mediante a globalização, cada vez mais homens com tais idéias se instalam na Europa com mulheres que eles possuem e brutalizam, e os europeus e demais ocidentais já não podem continuar fingindo que as graves violações dos direitos humanos só ocorrem em lugares remotos, muito remotos. A terceira mensagem é a frase final do filme: "Nunca me submeterei". É possível libertar-se - adaptar a fé, examiná-la criticamente e verificar até que ponto ela está na raiz da opressão.
Já me disseram que "Submission" é um filme por demais agressivo. Aparentemente, a sua crítica ao islã é muito dolorosa para que um muçulmano a suporte. Diga, não é muito mais doloroso ser uma mulher presa naquela gaiola?

"Infiel", de Ayaan Hirsi Ali.
Fotos: Ayaan e cena de "Submission"