Wednesday, January 07, 2009

O saldo de uma Guerra Santa

"'Estais vendo que mesmo vós não sabeis distinguir hereges de hereges? Eu, ao menos tenho uma regra. Sei que hereges sao os que põe em risco a ordem com a qual se rege o povo de Deus. (...) Nós a mantivemos por séculos. E, quanto aos hereges, também tenho uma regra, e se resume na resposta que deu Arnaldo Amalrico, abade de Citeaux, a quem lhe perguntava o que fazer dos cidadãos de Béziers, cidade suspeita de heresia: matai-os todos, Deus reconhecerá os seus'.
Guilherme abaixou os olhos e permaneceu um tempo em silêncio. Depois disse: 'A cidade de Béziers foi tomada e os nossos não respeitaram nem a dignidade, nem o sexo, nem a idade e quase vinte mil homens morreram a fio de espada. Feito o massacre, a cidade foi saqueada e queimada'.
'Mesmo uma guerra santa é uma guerra'.
'Mesmo uma guerra santa é uma guerra. Por isso talvez não devesse haver guerras santas'".

Diálogo entre dois estudiosos da teologia cristã, em "O nome da Rosa", de Umberto Eco.

E em que circunstância uma guerra é santa? E quando os dois povos e lados são de Deus, -dizem lutar por Ele, usam o nome dEle... aos olhos dEle, quem seria o lado certo, e quem seria seu?

Mas, não; mesmo sabendo que as maiores tragédias da humanidade tiveram um forte apelo e argumento religioso por trás, essa guerra atual não é assim. Não é por Alaah que o Hamas ou os palestinos estão lutando, e não é por Deus que os judeus estão lutando.
Essa, porém, não deixa de ser uma Guerra Santa. E o inimigo poderia personificar erroneamente o dito Eixo do Mal, como batizou um certo presidente americano -alegoria também errônea e ainda mais absurda a um também certo Eixo que existiu há décadas e que foi responsável pela morte de milhões de pessoas. Mas não personifica; não personifica porque a era de transformar os problemas do mundo em historinhas infantis maniqueístas já passou.

E ignorar a complexidade da situação é apenas fazer o que todos têm feito durante as últimas décadas: deixar de lado um problema latente e cada vez mais estrutural de uma região riquíssima em suas etnias, culturas e riquezas. A Guerra do Iraque e o caos posterior não estão aí por nada. A Palestina personifica, antes de tudo, o próprio Oriente Médio. E, assim como o próprio Oriente Médio, tem suas crenças e tem suas respostas infelizmente fundamentalistas. Mas, assim como todo o mundo, tem também pessoas que apenas querem viver em paz. Com uma casa. Com um emprego fixo. E sem medo de morrer no caminho ao mercado.

Mas não existe um lado inocente. Apenas muitos culpados. E centenas de vítimas.

1 comment:

Anonymous said...

Quando paro pra pensar que tanto os judeus quanto os palestinos têm a mesma raíz e história, cultural e religiosa... Quando percebo que esses que se destrem são irmãos, tenho a impressão de que nem Deus, nem o Diabo entendem o que os homens estão fazendo. A santidade dessa guerra tem exaltado o pecado.

Adorei teu blog, adorei teus textos. Beijo pra ti.